A terceira edição do relatório Hiscox Artist Top 100 (HAT 100) aponta para uma profunda transformação no mercado de arte contemporânea em todo o mundo. Após anos de altas especulativas e recordes de preços, o cenário atual revela uma retração significativa, marcada pela queda no valor das vendas, retornos negativos sobre investimentos e uma mudança no perfil dos colecionadores, agora mais cautelosos e voltados a obras de menor valor.
Esse novo ciclo do mercado é menos orientado pela especulação e mais focado na resiliência, acessibilidade e diversidade. Para colecionadores, investidores e instituições que atuam na preservação e guarda de obras de arte, compreender essa dinâmica é essencial para planejar estratégias e antecipar tendências. Para o cenário brasileiro, o destaque do relatório é a artista Marina Perez Simão, única do país a aparecer no ranking, na 85º posição.
Mercado se volta para obras mais acessíveis
Enquanto as vendas de lotes acima de US$ 1 milhão despencaram 41%, as transações de obras abaixo de US$ 50 mil cresceram 20%, movimentando US$ 59 milhões, um aumento de 5% em valor. Esse movimento sinaliza uma mudança de perfil: de especuladores para colecionadores mais focados em aquisição e preservação, além de tornar o mercado mais acessível a novos compradores.
Curiosamente, mesmo com a queda no valor total das vendas, o número de obras negociadas subiu 5%, alcançando um volume recorde. As obras contemporâneas (pós-2000) agora representam 58% de todos os lotes de arte pós-guerra e contemporânea vendidos em leilão, o maior percentual desde 2018.
Mais artistas nas casas de leilão e mais mulheres em destaque
Apesar do cenário adverso, o número de artistas com obras produzidas após 2000 presentes em leilões atingiu um recorde: 2.602 artistas, um crescimento de 12% em relação a 2023 e mais que o dobro do registrado em 2019. Do total, 40% tinham menos de 45 anos, consolidando a presença jovem no mercado, embora a demanda tenha diminuído.
O relatório também destaca um avanço na participação feminina: 822 mulheres artistas tiveram obras leiloadas, contra 728 no ano anterior. Na lista das 100 mais bem-sucedidas do HAT 100, 32 mulheres figuraram em 2024, frente a 30 em 2023. Yayoi Kusama manteve-se no topo, acompanhada por nomes como Cecily Brown, Lynette Yiadom-Boakye e Claude Lalanne.
Entre os destaques deste ano, a artista brasileira Marina Perez Simão aparece em 85º lugar no ranking, com um volume de vendas de US$1,2 milhão em 2024, consolidando sua presença no mercado internacional. A recordista, entre mulheres e homens, é a artista japonesa Yayoi Kusama, que registrou volume de venda de mais de US$58 milhões.
Queda acentuada nas vendas e nos retornos financeiros
As vendas em leilões de obras produzidas após o ano 2000 caíram 27% em 2024, totalizando US$ 698 milhões, ante US$ 956 milhões no ano anterior. Em relação ao pico registrado em 2021, a retração chega a 41%. Os dados apontam para uma retração da especulação no mercado, que atingiu seu auge na pandemia.
Jovens e emergentes perdem espaço
Um dos segmentos mais afetados foi o dos artistas com menos de 45 anos – não por causa da qualidade de seus trabalhos, mas como consequência da forte diminuição nas vendas de obras com preços superiores a US$1 milhão, mercado historicamente mais propenso à especulação. O valor das vendas desse grupo caiu 49%, enquanto o número de lotes vendidos caiu 7%.
As chamadas “wet paint” artworks – obras revendidas em leilão em até dois anos após sua criação – também caíram 64%. O número de lotes vendidos diminuiu 25%, atingindo o nível mais baixo em sete anos. Além disso, quase 20% dessas obras sequer encontraram compradores, enquanto a proporção de peças vendidas acima do valor estimado recuou de 63% em 2022 para 38% este ano.
Nova geografia do mercado: Nova York e Londres ganham espaço
Em termos geográficos, Nova York consolidou-se como a capital do mercado, concentrando 51% do valor total das vendas, um salto em relação aos 42% de 2023. Londres também avançou, representando 25% das vendas, contra 21% no ano anterior.
Em contrapartida, Hong Kong sofreu uma queda expressiva de 52% no volume financeiro movimentado, atingindo o menor patamar desde 2018. A retração está ligada à desaceleração econômica chinesa. Ainda assim, a cidade mantém relevância, com volume de vendas acima do registrado no período pré-pandemia.





